Por César Gama *
Os defensores da instalação de usinas nucleares ao longo do rio São Francisco sustentam a tese inverossímil de que a segurança em centrais como as de Angra dos Reis evoluiu e hoje é absoluta, não existindo o risco de acidente com vazamento radioativo. Razão pela qual a água do rio, consumida por quase 60% dos sergipanos e 40% dos alagoanos, em tese permaneceria potável pelo resto da eternidade, mesmo com a implantação das usinas planejadas pelo governo federal para o vale do São Francisco.
Para corroborar a tese que defendem, alegam que a segurança nos atuais reatores nucleares é muito reforçada e completamente diferente daquela que provocou os dois maiores acidentes nucleares, em Chernobyl, na Ucrânia, e Three Mille Island, nos Estados Unidos. Afirmam isso sem investigar os fatos ou deliberadamente omitindo as informações, sem o mínimo peso na consciência e sem levar em consideração que acidentes bem menores - que não tiveram a dimensão e divulgação midiática destes dois casos - são muito mais freqüentes do que se imagina e invariavelmente ocultados pelas empresas e governos que administram as centrais. E ainda assim, tais acidentes têm conseqüências desastrosas e permanentes, pelo menos até as próximas gerações, pois mesmo sem a explosão de reatores ou o derretimento do núcleo de centrais, acabam deixando vazar resíduos radioativos para o ambiente, provocando danos consideráveis à natureza e às populações humanas ao redor.
O exemplo mais evidente disso, já tratado na primeira parte deste trabalho, publicado na edição dominical do Correio de Sergipe de 21 de março de 2010, foi o acidente de julho de 2008 com a unidade nuclear da estatal Areva – a mesma que agora auxilia o Brasil na gestão das usinas nucleares - em Tricastin, na França, onde milhares de pessoas dos municípios ao redor da usina foram proibidas de consumir água do sistema municipal de abastecimento em virtude da contaminação por líquidos radioativos de dois rios, o Gaffiere e o Lauzons (afluentes do Ródano), que abasteciam as cidades da região. As comunidades locais são obrigadas a recorrer à água engarrafada, não podem nadar, pescar e nem mesmo utilizar água dos poços subterrâneos, em função do lençol freático da região ter sido afetado pela radiação. O mais grave é que a Agência de Segurança Nuclear francesa revelou à época que a contaminação do lençol freático já vinha ocorrendo antes do acidente de 2008, ficando claro que a estatal Areva ocultava os fatos da população.
Proibido beber água na Bahia
No Brasil, já há um acidente grave com radiação em curso e com deliberado ocultamento do fato pelo governo federal, aqui mesmo próximo a Sergipe, na Bahia, onde as comunidades dos municípios ao redor da mina de urânio das Indústrias Nucleares do Brasil, a estatal brasileira que administra a exploração do minério, sofrem graves consequências.
Desde dezembro do ano passado que a Secretaria da Saúde da Bahia notificou as prefeituras dos municípios de Caetité, Lagoa Real e Livramento de Nossa Senhora proibindo o consumo de água em seis poços artesianos e mananciais superficiais de água utilizados pela população rural destes municípios, em função do alto índice de radioatividade na água. A mina tem sido denunciada constantemente pelo Greenpeace por deixar vazar no ambiente grande quantidade de material radioativo desde que foi aberta, contaminando as terras e o lençol freático da região. As Indústrias Nucleares do Brasil negam sua responsabilidade e continuam a operar negligentemente na região. (Leia o relato na matéria seguinte).
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* César Gama é jornalista, psicanalista, professor, formando em Biologia, bacharelando em Filosofia e membro-voluntário do Greenpeace. Este artigo foi elaborado com dados de sua monografia de conclusão do curso de Licenciatura, intitulada O estorvo da Energia Nuclear: ou de como a suposta ‘energia limpa’ é tão cara ao ambiente.
Fonte : http://www.diariodeumsiderado.com/
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